segunda-feira, 8 de outubro de 2007

* Provocação - Esses Românticos Almoços de Domingo... (fragmento do meu próximo livro, "Desromance")

Há pouco tempo assisti uma peça teatral, que se chamava “Não sou feliz, mas tenho marido”, com a Zezé Polessa (maravilhosa!). Na verdade, um monólogo, baseado no livro de mesmo nome de Viviana Gómez Thorpe. A escritora, com muito humor e inteligência, fala sobre as inúmeras situações bizarras em que nos envolvemos quando entramos de cabeça num casamento de formato tradicional. Mas, não vou agora comentar o livro, ou a peça, que são ótimos (gostei mais da peça que do livro, porque esse traz um rancor mais carregado, que me incomodou um pouco). Quero fazer alusão a algo que a escritora diz logo no início do livro: que romanticamente apostara tudo na instituição menos romântica do mundo: o casamento.

Hoje quero comentar aqui uma das pegadinhas familiares que vem junto com o “pacote” dessa instituição: o “almoço de domingo”.
Minha mãe, hoje com 79 anos, quando mais nova foi uma dessas heroínas domésticas que nunca se desesperou (ou nunca demonstrou isso) por ter que cozinhar incansavelmente para uma família de nove pessoas. Aos domingos, fazia verdadeiros banquetes, e o almoço era um evento. A impressão que eu tinha era de que a família toda reunida à mesa significava “algo mais” para ela. Talvez ela acreditasse estar promovendo uma especial comunhão entre nós.
Eu não sabia ao certo que comunhão era aquela, porque o que percebia era que, enquanto minha mãe até suava para agradar a todos, meu pai comia calado, quase sempre de cabeça baixa, e meus irmãos estavam sempre de mau-humor, prontos pra dar a maior bronca nas três irmãs, que comiam tensas, devido ao clima não muito alegre. Ao final da refeição, eram as mulheres que iam para a pia, enquanto os homens faziam a sesta.

Casei, nos moldes tradicionais, e, como não podia deixar de ser, segui a tradição. Não exatamente por vontade própria, mas porque meu marido me convenceu, por um bom tempo, que também achava importante esse ritual gastronômico familiar. Mas, como tenho uma tendência a me rebelar quando a coisa não me agrada muito, logo fui percebendo que pra mim, o almoço de domingo só representava muito trabalho.
Meu marido se dava o direito de exigir menus especiais, sempre dizendo que tudo era “muito fácil”. Meus filhos, como acontece sempre entre irmãos, gostavam de coisas diferentes. A mesa era colocada na sala, o que fazia com que, ao final da refeição, eu fizesse uma dúzia de viagens entre a sala e a cozinha para recolher tudo. A louça ficava pra mim. E, se eu pedisse a ajuda do meu marido, ele imediatamente “repassava” isso para os meus filhos, o que acabava em bate-bocas desgastantes. Quando eu olhava pela janela, o sol havia ido embora, e o domingo junto.
Com o passar dos anos, fui tentando me livrar disso. Sempre que conseguia convencer a família, íamos ao restaurante. Mas, minha casa é uma casa de homens. Meu marido e meus dois filhos queixavam-se de ter que sair, num dia em que queriam ficar só “brisando”, pra compensar a semana de trabalho. E eu me perguntava se eles pensavam que durante a semana eu estivera hibernando, ou internada num spa. Porque afinal de contas, durante a semana toda, eles haviam almoçado e jantado almoços e jantares que eu fizera! E eu, ia descansar quando?

De alguns anos pra cá, sair para almoçar no domingo ficou praticamente impossível, porque o jogo de futebol dominical adquiriu importância tão grande que passou a ser a referência para tudo. Se fôssemos ao restaurante, não conseguiríamos voltar a tempo para que eles vissem o jogo do começo. Então – eles concluíam – era melhor que eu cozinhasse.
Aos poucos, o romantismo que eu herdara de minha mãe sumiu de vez e percebi que o que os homens querem mesmo é encher a barriga, de preferência antes que o jogo comece. E passei a ser mais simples, fazendo almoços práticos e comendo na cozinha mesmo.

Me separei, meu marido foi morar em outro andar e às vezes compra algum campeonato que a TV aberta não vai transmitir. Nesses domingos, tenho que ajeitar qualquer coisa para comermos mais cedo, porque os meninos vão pra casa do pai, atrás do futebol, e me deixam sozinha à mesa.
Outro dia, comentando com minha mãe essa situação tão pouco romântica, ela me disse que eu é que acabara com o romantismo!

Domingo passado meu ex-marido, cheio de boas intenções, pediu à mãe que viesse à sua casa fazer uma bela lasanha e convidou, a mim e aos meninos, para almoçar lá. Minha sogra se esmerou e, como não podia deixar de ser, se atrasou! Quando o almoço saiu, o jogo já havia começado. Servimos a comida, sentamos à mesa, e colocamos a TV numa posição em que os homens pudessem apreciar o jogo. O almoço foi a coisa mais romântica que já vi! Na falta de palavras para descrevê-lo melhor, vou fazer uma ilustração:





Eu sei que essa é a minha situação, não quero aqui esculachar com os almoços de domingo de forma generalizada. Mesmo eu, às vezes, quando quero, faço uns ameaços de banquetes bem gostosos, com todo o carinho do mundo. Mas, peço aqui, se alguém discordar do que escrevi, que, por favor, me envie seu comentário, de preferência descrevendo suas motivações, pra que eu e quem pensa como eu, possamos repensar e, quem sabe, ficar um pouco mais românticas...

Obrigada, e um abraço!

Ana Lucia

10 comentários:

Unknown disse...

Ola
Bom tia, eu não tenho esperiência própria em preparar almocos p/ maridos, ate pq nao tenho rs...
Mas já analisei mtas dinâmicas de romantismo, e sinceramente não são nada similares ao que sonhei qd pensava nisso.
O que posso dizer é que agradeço qd meu pai me diz: filha, faça td, mas não casa, ok?
é, acho que ele realmente me ama.Rs...
Bjos e parabéns por ter se rebelado novamente

Ana Lucia Sorrentino disse...

Paula: Eu não quero falar contra o casamento, mas contra o casamento nesse formato tradicional, que traz uma série de regras pré-determinadas de comportamento "adequado". O que eu quero sempre enfatizar é que não é legal acreditar em tudo o que nos disseram sem questionar. Acho que o "almoço de domingo" vem junto com o "morar na mesma casa", "dormir na mesma cama", "só sair juntos", "só ter amigos casados", "ela cuida da casa eu do dinheiro", e outras tantas coisas que podem ser prazerosas se não forem "obrigatórias". E, principalmente, gostaria que as pessoas, nesse espaço, expusessem idéias novas, novas formas de lidar com essas questões. É claro que há momentos em que os homens têm que estar com homens, e as mulheres com as mulheres. Esse caso do almoço que citei é típico. Mulheres "sobram" quando vários homens fanáticos por futebol torcem desesperadamente pelo seu time. Não há problema nisso. O problema é se forçar a barra para estar juntos, num momento que não é adequado. Acredito, sim, que a união de duas pessoas pode ser algo muito bom. Acho filhos algo maravilhoso. Na minha vida foram um verdadeiro marco, me transformaram em alguém muito melhor. Acho fundamental ser mãe. Só não acho legal quando querem me fazer acreditar em coisas que não existem. Se minha família é unida e feliz, não vai ser o almoço de domingo que abalará sua estrutura. Eu estou procurando um caminho pra viver melhor.
O Dalai Lama diz que o amor romântico não leva à felicidade. E eu acredito nisso, porque o romantismo traz todas essa "regras" de como devem se comportar pessoas que se amam. E quando essas expectativas são frustradas, as pessoas se sentem infelizes e acham que não são amadas. Mas o amor deve ser algo muito além de qualquer norma de comportamento. Deve ser algo que solta, que liberta, que aceita que o outro seja como é.
Nossas antepassadas nos passaram, e aos homens, a idéia de que a mulher que ama cuida, protege, alimenta, etc... Mas eu acho que não é necessariamente assim. Eu acho que a mulher que ama, ama. E quer que todos sejam felizes, do seu jeito!
Obrigada pelo seu comentário, e continue sempre questionando!
Beijão!
Analú

Anônimo disse...

Hahahahahahaha
Primeiro tia Nalú, eu adoreeeei sua ilustração!
Segundo, eu tenho vontade de casar, constituir uma família.....e tudo que vem na bagagem. Mas confesso, q às vezes me pego em situações, q me fazem gastar um bom tempo pensando: "mas como é, realmente, que eu vou fazer para dormir todas as noites com um ronco do meu lado?"
Eu que sou filha única, não muito acostumada a dividir meu espaço, vejo ess divisão de cama acompanhada de barulhos como um problema concreto....rs
Acho que as pessoas quando se casam, devem juntar e dividir os seus ideais, planos, sonhos, almas.....e não o espaço físico!
De uma coisa eu tenho certeza, eu n vou no benheiro com ninguém me olhando porque quer aproveitar pra fazer a barba jamais! Levanto a bandeira do romantismo sim, mas um romantismo modernizado, com mais bom senso e menos ragras ultrapassadas.
Mas q eu ainda quero um marido eu quero.....rs

Anônimo disse...

Olá! Tenho acompanhado os mais diversos blogs.. e dia desses passei por aqui..
Não resistí em deixar um pequeno comentário sobre os "almoços de domingo"..rs
Tenho praticamente a sua idade e também fui criada pra casar etc etc, o que também aconteceu.. e me separei..
Mas, vamos ao que interessa.. Até hoje me preocupo com a comidinha do domingo (coisas de mãe e mulher prendada, que me parece vc também é!rs), porém louça não lavo de jeito nenhum!!! Nem sob tortura!! Se não querem (meus filhos) almoçar em restaurante, que façam sua parte...rs Inclusive, dependendo do dia, que cada um coma no cômodo que quiser...rs
Hoje, talvez um pouco mais madura, também mudei meu conceito sobre romantismo... Acredito que regras impostas (mesmo que inconscientes) acabam danificando parte de nossas vidas.
O equilíbrio entre ações e emoções pode ser natural na medida que soltamos algumas "amarras" pré-estabelecidas no decorrer de nossa vivência e maturidade.

Parabéns pelo conteúdo do seu blog.

Mara

Ana Lucia Sorrentino disse...

Lívia: Eu é que adoreeeei você ter passado por aqui!É isso aí, eu não quero mesmo que as pessoas desistam de casar, mas que casem com expectativas realistas, baseadas em suas próprias idéias, e não no que a sociedade "inventou". Acredito que cada um deve decidir o que serve ou não pra si mesmo e para seu companheiro e que os dois conversem muito, pra que um não entre no casamento esperando do outro o que ele não está disposto a dar. Agora você está intimada a voltar sempre, tá bom?

Mara: Fico contente que você tenha se manifestado! É muito bom saber que as pessoas passaram por aqui, e melhor ainda quando sentiram necessidade de deixar seu recado!
Acredito que é isso mesmo o que acontece: depois de passarmos parte da vida "testando"o que nos ensinaram, acabamos encontrando nossas próprias fórmulas para viver bem. E tenho certeza de que, quanto mais nos desvencilharmos de idéias pré-concebidas, mais chance teremos de ser feliz!
Passe sempre por aqui, e acompanhe o workshop do "Mulheres que correm com os lobos", que só funcionará se as leitoras se expressarem!
Obrigada, e um
Beijão!

Analú

Anônimo disse...

Cara Analú,

Casei sem pensar em nada, só senti. Era tanto amor que nem cabia dentro de mim!! Nunca pensei em como as coisas seriam, acho que nem idealizei nada. Sempre me perguntavam o que eu esperava do casamento, ou quais eram minhas expectativas. E as pessoas sempre se assustavam com a resposta: nada e nenhuma, respectivamente. Eu não espero nada do meu casamento, espero de mim. É claro que isso gera muita cobrança de minha propria parte e muitas vezes minha autocrítica é feroz, chega a me machucar. Meu marido nunca me cobrou nada, é o cara mais relax que já conheci. Se não tiver almoço não faz mal ... "agente come qualquer coisa". Chega a ser engraçado. Acho que lá em casa nada é tradicional, minha profissão não permitiria isso. Meu marido tem um grande censo de renúncia isso sim. É um anjo...
Adorei a ilustração, principalmente pq conheço todos os personagens, sei que é assim mesmo que a coisa funciona na sua casa e a sua descrição não poderia ser mais real. Entrei na história, almocei com vcs. Adorei!

Marina (eu mesma)

Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Ana Lucia Sorrentino disse...

Marina: Que gostoso te encontrar por aqui! E, pelo menos virtualmente, almoçamos juntas, hein? rsrsrs... Bacana, Marina!
Fiquei contente de ver que você, de uma geração depois da minha, já sabe que deve esperar as coisas de você mesma, porque esperá-las dos outros, muitas vezes é fórmula certa para a decepção.
Pra dizer a verdade, quando casei, me sentia exatamente dessa forma que você falou, cheia de amor e sem esperar nada. Não tinha elaborado nada na minha mente! Mas, acho que sofremos, o tempo todo, pressões da sociedade para que nos comportemos de determinada maneira. Se formos mais fracos, sofreremos mais. Se mais fortes, sofreremos menos. A impressão que você me dá é a de que é bem forte, cabeça feita mesmo. Parabéns!
E outra coisa que esse teu depoimento me passou foi que ele também tem a mesma cabeça. Isso é ótimo! Gostei de sentir o carinho com que você falou dele! Mas, acho que aqui cabe um alerta para quem esteja prestes a se casar: coloquem muito claramente, um para o outro, o que os dois esperam do casamento e do parceiro. Isso, na minha opinião, deve ser expressado em palavras mesmo, nada de gestos, em voz alta, para que os dois estejam completamente conscientes do que o outro está esperando, se outro tem ilusões ou está fantasiando. Quanto mais essa união se basear na realidade, mais ela terá chance de ser agradável e de permitir o crescimento dos dois. Obrigada pela visita, Marina, e volte sempre!

Beijos!

Analú

Anônimo disse...

Almoços de domingo...
Analú, nunca esqueço o cheiro das laranjas nos almoços de domingo na casa de sua mãe e o cafézinho. Adorava estar lá, grandes momentos, sempre estão em minhas lembranças. Agora deve precisar uma super mesa para todos. Mande muitos beijos a todos, pois estão sempre em meu coração...

Ana Lucia Sorrentino disse...

Esse tipo de comentário é muito legal, porque me faz pensar que, realmente, um pouco de romantismo vale a pena... É super gostoso perceber que todo o amor que minha mãe sempre teve, e sua dedicação à família e até seu romantismo, fizeram dela uma pessoa presente na memória de muitas pessoas que compartilharam tudo isso com ela e que, hoje, depois de muitos anos, falam dela com tanto carinho...
Um super obrigada, anônimo! Mas, que é você? Fiquei curiosa! Passei seus beijos a todos, mas não pude dizer de quem era o beijo, porque você não se identificou!

Beijo!
Analú