Já
já 2013 acaba e começa 2014. A gente vai piscar e num instante vai ter passado
toda essa euforia que trazem o Natal e o final do ano. E, como disse Saramago
ao receber o Nobel: e daí?
Não.
Eu não quero criticar os que estão comemorando efusivamente. Desejo
sinceramente que todos sejamos felizes à própria maneira.
Mas
hoje me deu vontade de contar que duas perguntas insistiram em me acompanhar ao
longo do ano: “e daí?” e “pra que tudo isso?”. E creio que elas me ajudaram, e
muito, a definir minhas prioridades.
Estive
o ano todo fazendo o que era possível. Pouco pude escolher, o que muitas vezes
me pareceu uma bênção. Mas, as poucas escolhas que pude fazer, as fiz todas no
sentido de simplificar.
Enquanto
2013 caminhava, as pessoas polemizavam. Sobre tudo, absolutamente tudo. E eu me
perguntava: e daí? O que resulta disso? Cansei de ver, neste ano que passou,
inúmeras boas ações, públicas e privadas, serem duramente criticadas porque
“poderiam ser melhores”. O bem se transformando em mal simplesmente porque
havia uma grande disposição de muitos para a crítica destrutiva. Compreendi que é melhor fazer, calado, mesmo
correndo o risco de ser criticado, do que criticar e não fazer.
Frente
à enxurrada de contradições promovida pelos jogos midiáticos, por partidos
políticos e por especialistas e leigos em todo e qualquer assunto, à febre opinativa
que se deflagrou como praga pelas redes sociais, à falta de respeito pela opinião
alheia, à agressividade em detrimento da boa argumentação, à leviandade das
boatarias e à impossibilidade absoluta de se checar uma a uma as informações
que se espalhavam com rapidez jamais vista, muitas vezes me vi ceticamente muda
e muitas vezes senti que, afinal, o que importa de verdade é indizível. Escrevi
pouco, fiquei mais introspectiva.
Esse
ano que passou eu me mudei de um décimo segundo andar - onde a vista era
maravilhosa, mas de onde eu via o mundo de longe -, para um prédio antigo, sem
elevador, em uma rua de paralelepípedos, que não parece estar dentro de São
Paulo. Estou montando meu lar à mão. Eu mesma revesti a parede da minha cozinha, fiz meu abajur, forrei meu gaveteiro antigo, e fiquei orgulhosa do resultado! Minha casa está ficando com a minha cara. Tive o prazer de conseguir escutar novamente o silêncio da noite, o
despertar dos pássaros logo cedinho, e crianças brincando na rua. De ouvir a
chuva, de ver estrelas, de ficar debruçada na janela. Encontrei gente simples,
mais solícita e interessada. Fui trabalhar a 150 passos de onde moro e meti a
mão na massa, literalmente. Fabriquei montanhas de pão sem glúten, na certeza
de estar dando um alento aos celíacos. E
um dos melhores dias do meu ano foi o último dia de trabalho, lavando todo o
equipamento da cozinha sob um sol forte, me relacionando com a água como não
fazia há tempos. Me perguntei por que foi mesmo que eu fiquei tanto tempo
revisando textos alheios, de gente que nem ao menos escreve por amor ou pela
verdade e que tem na escrita uma roupagem de gala para o Oscar de uma vida de
mentira. Pra que tudo isso?
Nos
últimos meses desse ano eu raramente me maquiei, raramente pintei as unhas, e
aposentei de vez o salto alto. E como foi bom... E cada vez mais, quando vejo
mulheres se autoflagelando em horas e horas de cabeleireiro, montadas em
saltos-agulha de sapatos de bicos finos, enfiadas em soutiens estruturados e jeans
esturricados, me pergunto: pra que tudo isso?
No
ano que vem, eu quero ter apenas as contas que eu possa pagar, pra poder
trabalhar apenas o suficiente. Quero trabalhar com prazer e junto de pessoas
gentis. Quero estudar, porque amo estudar. Quero poder não só comer, mas saborear. Quero poder dormir até descansar. Eu quero conseguir dar
atenção a quem me procura, compreender quem quer se fazer entender, ser
compreendida por quem tem interesse no que penso e estar perto de quem me quer
perto. E quero produzir. Produzir coisas boas de todas as espécies. Comidinhas,
textos, poesias, arte, afetos... Eu quero assumir cada vez mais a minha simplicidade, e quero que as
pessoas sintam que é fácil lidar comigo. E quero lidar com gente também fácil,
acessível, gente de verdade.
Esse
ano que passou eu voltei a sentir que tenho pele. Ano que vem eu quero estar de
pé no chão, cara lavada, coração aberto. Eu quero uma vida simples. Eu quero
simplesmente dar conta da minha vida.
E,
se há algo bacana pra eu desejar a todos que talvez venham a ler esse texto, acho
que é isso: eu desejo que vocês deem conta das suas vidas. Que tenham
caráter e dignidade. E que tenham tempo e disponibilidade interna pra serem felizes. Porque,
acredito eu, é em cada um que começa um mundo melhor.
Beijão! :)
Ana Lucia Sorrentino
PS: A perereca aí em cima sou eu mesma. ;)