segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Pensemos o mundo com Bauman


Uma caravana de cerca de 3 mil imigrantes, em sua maioria saídos de Honduras há cerca de um mês, tenta chegar aos EUA para pedir asilo. Segundo matéria do G1, dezenas deles disseram, em entrevista ao Associated Press, que deixaram o país por conta da violência e da extrema pobreza. Na passagem por Tijuana, cidade fronteiriça do México, a caravana enfrentou um protesto de centenas de moradores. Uma manifestante disse aos repórteres que o governo deles é que deveria tomar conta deles, enquanto manifestantes gritavam "Fora!" e "Não os queremos em Tijuana!".

Todos os dias Bauman me ajuda a pensar sobre o que acontece no mundo. No capítulo VII de O conceito de amor líquido em Bauman, de minha autoria, faço uma compilação de fácil leitura das análises de Bauman sobre a questão migratória. Transcrevo abaixo alguns trechos esclarecedores:  

Bauman afirma que a modernidade "produziu desde o início, e continua a produzir, enormes quantidades de lixo humano". Ao produzir e reproduzir determinada ordem social, a modernidade considera lixo tudo o que não serve a essa ordem. Por outro lado, o progresso econômico também transforma em lixo todos os modos de subsistência que não servem aos padrões de produtividade e rentabilidade em constante elevação. À medida que o modo de vida moderno se espalha pelo planeta, diminuem os "aterros sanitários" que poderiam recolher tal "lixo humano", que passa a representar sério perigo de autocombustão e "explosão iminente".[...]
[...] o mundo [...] tratou de criar métodos cada vez mais rígidos para controlar os movimentos humanos: "Passaportes, vistos de entrada e saída, alfândegas e controles de imigração foram invenções originais da moderna arte de governar."
[...] Bauman lembra que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, foi objeto de crítica de Hannah Arendt e de Giorgio Agamben por sua falta de clareza quanto aos termos "homem" e "cidadão" e por vincular a cidadania ao pertencimento a uma nação, fazendo com que os direitos do homem se tornassem inaplicáveis a qualquer ser humano que não se encaixasse na definição de "cidadão", por não pertencer a algum Estado soberano. Aos "refugiados"- como são chamados a partir de meados do século XX "aqueles que não têm um lugar próprio no mapa-múndi mental dos cidadãos dos Estados soberanos" – cabiam múltiplas rejeições antes que o Estado aceitasse seu ingresso na família nacional, não sem a exigência prévia de que "imitassem a nudez do recém-nascido", ou seja: aniquilando seus valores anteriores. Bauman esclarece que a soberania praticada pelos modernos Estados-nação está "inextricavelmente limitada a um território". A trindade "Estado – nação – território" trata tudo o que não se componha desses três elementos como "anomalia" e se reserva a arrogante posição de metrópole, transformando o resto do planeta em periferia e sujeitando-a às suas regras. Aqueles a quem a trindade rejeita são lançados à terra de ninguém, a uma vida "que não vale a pena ser vivida".
[...] Eles são expulsos ou afugentados de seus países e sua entrada em outros é recusada. Perdem seu lugar na Terra. Enquanto a elite global flutua, poderosa, pela extraterritorialidade, eles se tornaram "um alvo fixo em que se descarregar o excesso de angústia..." Onde quer que estejam, são indesejados.
[...] Bauman conta que os imigrantes cuja deportação é mais difícil são confinados em campos de refugiados em locais remotos e isolados, o que impossibilita definitivamente sua assimilação à vida econômica do país. Não pertencem ao país em que vivem, não são sedentários nem nômades, são alvo de suspeitas e ressentimentos, não podem voltar ao país de que saíram, enfim: são "impensáveis", "inimagináveis", "inefáveis".
[...] Bauman considera que "até aqui as perspectivas são sombrias", mas afirma que nosso consolo "é o fato de que a história ainda está conosco e pode ser construída".

Se você tem vontade de entender como chegamos onde estamos e se interessou por Bauman, pode começar lendo O conceito de amor líquido em Bauman, de minha autoria. Tenho certeza de que isso facilitará seu mergulho nas obras do próprio autor. Para ler um excerto gratuitamente, adquirir o livro ou conhecer um pouco mais do meu trabalho, basta acessar minha página - Ana Lucia Sorrentino - no site da Amazon. Lá você encontrará a versão digital e também o livro físico. E boa leitura!

                                                                                                          Ana Lucia Sorrentino