Domingo passado Rafinha Bastos, jornalista e comediante, ex-integrante do programa CQC, da Band, foi o entrevistado de Marília Gabriela no De Frente com Gabi, do SBT. E, veja só... a criança chorou...
Imagino que aqui seja até desnecessário detalhar todo o caso, que envolveu Rafinha Bastos e a cantora Wanessa Camargo, porque é algo que o Brasil inteiro acompanhou, não pela importância, mas pelo tamanho da repercussão. Mesmo que não estivéssemos interessados no assunto, o assunto vinha até nós, devido à amplitude da popularidade dos personagens envolvidos.
Mas, resumidamente: Rafinha, em uma de suas piadas de mau gosto, ao falar sobre a gravidez de Wanessa Camargo, disse que “comeria ela e o bebê”. E isso desencadeou uma série de desdobramentos desagradáveis que, parece-me, têm provocado reflexões até mesmo em seu protagonista, que se assume arrogante, mas que chorou ao falar sobre sua preocupação com o pai por conta do episódio.
Essa é uma história de deselegância. De uma tremenda deselegância.
E, por que quero comentá-la? Por isso mesmo.
Rafinha Bastos é um desses fenômenos que a cultura do trash produz. Quanto pior, melhor.
Devo confessar que logo que o CQC foi ao ar me causou certa curiosidade, porque me parecia que seu elenco prometia algo diferenciado. Impossível colocar em dúvida a inteligência dos jornalistas e comediantes que ali atuavam. Não demorou muito para que eu percebesse que, apesar da promessa, o programa caía no mesmo de sempre: um humor inteligente em certo sentido, mas apelativo, como quase todo o humor que se produz no Brasil. Uma graça que se faz em cima do desrespeito aos seres humanos, tendo quase sempre como mote o triste e o desagradável. Parece que muita gente acha graça da desgraça. E, pelo que se percebe, deve ser muito difícil escapar dessa fórmula já consagrada. E Rafinha sempre foi, dos integrantes do programa, o mais apelativo. Depois de desligar a TV ou trocar de canal algumas vezes, por conta de suas piadas de extremo mau gosto, desisti por completo de assistir o CQC.
A questão é: por que é tão frequente a inteligência nos prestar esse desserviço de plantar um pouco mais de falta de educação, grosseria, deselegância e machismo num país tão carente de boas sementes de educação, gentileza, e elegância? Essa é uma daquelas contradições pra se pensar por toda uma vida, se necessário: por que a inteligência faz questão de produzir desinteligência?
Em certo momento foi plantada uma ideia de que o público gosta de porcaria. Tanto regaram essa ideiazinha, tanto esforço fizeram pra que ela vingasse, tanto a semearam em mais e mais cabeças, tanto recompensaram quem comprou essa ideia, que hoje a praga se alastrou de tal forma que tomou conta de tudo.
A molecada que cresceu assistindo Hermes e Renato e Pânico na TV acha super normal um comediante que apela pra grosseria ter o Twitter mais influente do mundo. E acaba achando que isso é sucesso, e que o cara realmente deve ser o máximo, pra conseguir tanta popularidade.
E então, nós, que queremos educar, perdemos um tempo enorme tentando explicar que ser muito popular não significa, necessariamente, estar fazendo algo de bom. E que “sucesso” é algo muito subjetivo. Ter muita popularidade, ser muito seguido nas redes sociais, exercer muita influência não significa, necessariamente, que se está fazendo um belo trabalho. E, será mesmo possível que alguém lúcido possa se considerar uma pessoa de sucesso, tendo consciência de que esse sucesso é fruto da apelação?
O fato é que, embora faça piadas grosseiras em cima de todo mundo, e embora considere isso um direito seu, “em nome da profissão” e da “liberdade”, Rafinha parece, nessa última semana, ter começado a entender que é possível, sim, ser livre, mas até a liberdade tem seu preço. Quando a graça sem-graça que fez em cima de uma família ricocheteou na sua própria família, aí ele percebeu que por trás da piada há seres humanos. E aí, pensando no sofrimento que está causando ao pai - vejam só - , Rafinha se emociona e chora. E diz que a única coisa que lhe importa é a família. A dele, é claro, não a dos outros. Menos mal, hein... parece que a criança está começando a crescer.
Confesso que, pra mim, foi um alento perceber que até alguns jovens que o tinham como “o cara” no início disso tudo conseguiram refletir e perceber que pra tudo há um limite. E que tudo tem consequências.
Bem...pelo jeito, Rafinha é aquele que perde o amigo, mas não perde a piada. E, além do amigo, perde também o emprego. Mas, como ele mesmo diz, ele “está cagando pra tudo isso”. Porque, pra certo tipo de gente, enquanto a coisa não dói no bolso, tá tudo bem. E como nós vivemos num país onde a boa educação vale muito pouco, uma outra emissora já o contratou, muito provavelmente por um salário milionário. Certamente não com o objetivo de ter uma programação de boa qualidade, mas focando na audiência, que, no final das contas, é lucro certo.
E isso vira uma bola de neve: a grosseria ganha espaço e faz discípulos. Que hoje consomem grosseria e amanhã produzirão grosseria. É um vale-tudo em nome do dinheiro.
E pensar que há tanta gente valorosa e bem educada que se empenha para criar um mundo um pouquinho melhor que nem emprego tem...
Analú 30/03/2012
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