domingo, 2 de agosto de 2020

Desistória

   

 

Eu escrevo esta desistória para que não se perca no nada, de onde veio e de onde, talvez, guarde alguma saudade. Temo que suma no vazio da memória. Nutre-me o ânimo pensar que, escrevendo-a, posso dela reter alguma beleza que, tivesse sido vivida, poderia ter. Escrevo pensando-a como uma não-desilusão, porque já foi gestada fadada a ser em vão. Não me foi permitido crer que viesse a acontecer, senão em minha fértil imaginação. Vivo, desde sempre, abortando gestações imaginárias. E não, não deixarei de engravidar. A ideia do inédito, à parte o descrédito que merece o mundo, me alimenta a alma e me permite atravessar esses áridos e inférteis desertos com alguma alegria. Está em mim. Brota. Floresce. Quero crer que em algum momento a vida possa, de fato, ser. Enquanto isso, sigo tecendo-a com fios do que não foi. Há nessa desistória personagens que poderiam ser lindos, não fossem tragados pela negação do belo. Há vontade, muita vontade, e uma imensa predisposição à compreensão e à cumplicidade. Há doçura, lealdade, há sentimentos nobres e olhares que entram pelas retinas e flecham, como um cupido, nossos corações já tão vividos. Que desistória bonita essa que nunca foi!... Causa-me um sentimento cujo nome ainda não existe essa impossibilidade de me sentir triste por saber que minha possível tristeza tem muito mais a ver com o que imaginei do que com o que de fato existe... Mas quando olho, assim tecida, a trama da minha vida, agrada-me encontrar tanta cor e tanta luz. Aqueles longos fios de tristeza dos inúmeros não-vividos não raro emprestaram real beleza e até mesmo alguma alegria aos tons tão pastéis de tudo...

 

    Eu escrevo esta desistória para que não se perca no nada, de onde veio e de onde, talvez, guarde alguma saudade. Temo que suma no vazio da memória. Nutre-me o ânimo pensar que, escrevendo-a, posso dela reter alguma beleza que, tivesse sido vivida, poderia ter. Escrevo pensando-a como uma não-desilusão, porque já foi gestada fadada a ser em vão. Não me foi permitido crer que viesse a acontecer, senão em minha fértil imaginação.
    Vivo, desde sempre, abortando gestações imaginárias. E não, não deixarei de engravidar. A ideia do inédito, à parte o descrédito que merece o mundo, me alimenta a alma e me permite atravessar esses áridos e inférteis desertos com alguma alegria. Está em mim. Brota. Floresce. Quero crer que em algum momento a vida possa, de fato, ser. Enquanto isso, sigo tecendo-a com fios do que não foi.
    Há nessa desistória personagens que poderiam ser lindos, não fossem tragados pela negação do belo. Há vontade, muita vontade, e uma imensa predisposição à compreensão e à cumplicidade. Há doçura, lealdade, há sentimentos nobres e olhares que entram pelas retinas e flecham, como um cupido, nossos corações já tão vividos. Que desistória bonita essa que nunca foi!...
    Causa-me um sentimento cujo nome ainda não existe essa impossibilidade de me sentir triste por saber que minha possível tristeza tem muito mais a ver com o que imaginei do que com o que de fato existe...
    Mas quando olho, assim tecida, a trama da minha vida, agrada-me encontrar tanta cor e tanta luz. Aqueles longos fios de tristeza dos inúmeros não-vividos não raro deram algum sentido, emprestaram real beleza e até mesmo alguma alegria aos tons tão pastéis de tudo...

           
                                                            Ana Lucia Sorrentino

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