sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Poesia - Culpa Tua (Alento)

Culpa Tua

Na rua me elogiam
meus cabelos anelados.
Me olho no espelho
e quero cortá-los,
mudar sua cor.
Invejam minha magreza,
que eu sei ser doentia.
Cansaço puro.
Fico nua na tua frente,
mas jamais consigo.
Teus olhos parecem ficar nas costas,
cegos, inibidos.
Nada adianta...
Meus tratos, meus carinhos,
meus cuidados...
Perto de você sou assexuada,
amiga, irmã de aluguel.
Você dorme do meu lado
e já não se encosta mais,
se isola.
Me machuca e me reprime.
Me peguei sonhando, uma manhã,
com um garoto loiro, da TV.
Eu tinha quinze anos no sonho,
leve, solta, crente.
Ele me deu um beijo
e eu tremi, dormindo.
Não queria acordar.
Quando o revi, no vídeo, corei.
Adolescente total.
Talvez eu tenha quinze anos...
Meus suspiros engolidos
se espalham por aí,
meus desejos se dispersam,
não aceitam mais comando.
A cada ombro largo,
cada sorriso aberto,
a cada olhar maroto,
me derreto toda,
sorvete ao sol tropical.
Eu sou tropical,
mas meu lar é glacial.
Meus ais são por tudo
e tudo me lembra você.
Tudo me queima, me arde,
tudo eu quero.
E você deita do meu lado e dorme.
Eu não te olho de frente,
porque o você dos meus sonhos
é mais excitante, mais quente.
Me agarra, me beija a nuca,
me despe, me faz carinhos,
morre por mim.
É como o você de antigamente.
Eu queria poder dizer que não é nada disso,
mas há uma pressão entre as minhas coxas.
Meus nervos já não dão
pras cenas de amor no cinema.
Agora escolho ficção,
violência.
Alivia a tensão...
Distrai, ao menos.
Eu te queria tanto,
agora eu quero tanto tudo,
o mundo parece que vai acabar amanhã,
não dá mais tempo, não dá...
Você dorme e eu me mexo,
energia pura.
Tentei canalizá-la pra coisas mais nobres,
mas parece que ela se multiplica.
Você me gela e eu fico cada vez mais quente.
Eu tenho me gostado tanto, de repente...
E os quadris...
Ah! Os quadris me deixam louca...
Quadris finos em calças desbotadas.
Quadris jovens, esbeltos, espertos...
Meu Deus, que tarada!
Todos, todos os quadris
me lembram os teus
jogados displicentemente pra frente,
em conversas descontraídas.
Teus quadris em calças justas...
Se me der coragem,
algum dia vou fotografá-los.
Um "close" da cintura ao início das coxas:
jeans justos, surrados,
vestindo quadris debochados.
Quando ficar velhinha, vou olhar pra foto,
no porta-retratos,
e lembrar dos meus desejos
infantis,
adolescentes,
juvenis,
adultos,
sei lá...
Meus desejos exagerados,
porque nunca saciados.
Meus desejos escondidos,
proibidos.
E você dorme do meu lado.
Inocente...
Totalmente culpado.
Da minha ânsia,
da minha aflição,
do meu desagrado.
Às vezes me dá medo,
porque me sobram duas opções:
ou você acorda,
ou me acabo numa combustão espontânea.
Acorda, por favor...

(Alento - 2007)

Beeeijos!!!

Analú :)

6 comentários:

Jacque disse...

Muito Lindo.

Beijo.

Jacque

João Esteves disse...

Nessa culpa, vai todo um universo volitivo. O monólogo parece representar um caso igual ao de muitas possíveis combustões espontâneas.
Sabe, lembrei do Hamlet e do pra lá de célebre "ser ou não ser, eis a questão".
Mas Culpa Tua não parece investido de intenções tão filosóficas assim. Tá mais no tom do "Grito de Alerta"
"nosso caso é uma porta entreaberta/ eu busquei a palavra mais certa/ vê se entende o meu grito de alerta/"
No caso, vê se entende e faz alguma coisa, que ainda é tempo, sempre é. Mais explicitude nem dá.
Perfeito.
Beijos

OLHAR CIDADÃO disse...

Ana

Boa tarde

Uma bela leitura nessa ensolarada tarde.

Texto forte...acorda amor.

Um abraço

sueli schiavelli jabur disse...

ana querida amiga, que lindo, você sempre sensacional, as vezes nos sentimos mesmo estando em combustão, mas é só um momento, tudo passa, uma excelente semana, bjs

Vanessa disse...

Esse é um dos meus favoritos..rs..adorei relê-lo!!! ;-)

Zé Carlos disse...

Ana Lucia, que delicia de poema... já te encontrei no Orkut e fiz meu pedido de amigo.
Um beijo grande do ZC