Ela
nunca leu um livro, nem mesmo pela metade. Nunca leu Nietzsche, Schopenhauer, nem
Marx.
Todos
os dias faz uma passeata solitária entre o terminal e a casa da patroa.
Sob
um sol causticante, abre caminho entre olhares e desejos vãos de trabalhadores
cansados.
Nem
sabe o que é ateísmo. Leva Deus dentro da bolsa, num DVD evangélico.
Alisa
camisas e calças, arrasta móveis, respira desinfetantes e nunca deixa de
sorrir.
Depois
do banho, à noite, encontra o marido roncando, a cama já desmanchada do esgotamento
do dia.
Ela
nunca leu um livro, nem mesmo pela metade.
Mas,
se a convidarmos a palestrar como doutora em tocar o barco, discorrerá
lindamente sobre o poder da fé, que lhe permite operar milagres, sem nunca ter
capital.
E
falará com maestria, de corpo inteiro talvez, o que é, pra uma mulher de
verdade, ter
vontade de potência.
Analú